sábado, maio 30, 2015

O Sal da Terra

Sebastião-Salgado-fotógrafo carrega sempre duas câmeras a tiracolo. O Sebastião-Salgado-Sebastião-Salgado-mesmo, Sebastião-Salgado-Junior, se protege do sol com um chapeuzinho rústico. Parece, sim, um gringo, mas sua voz em português é mais doce que em francês. Já Lélia em francês tem força e é mulher marcada pelo sol.
Os projetos de Sebastião Salgado são descritos em escala crescente de ambição, se é que se pode assim dizer - ambição artística, procura inquieta, como quem gera um projeto já na própria execução de um primeiro. Da descrença retorna à beleza; da miséria, da pobreza, da seca, dos ossos, da lama, do fogo, do petróleo e da morte retorna à vida, à natureza, aos animais sorridentes e permissivos retratados em estado de felicidade no habitat natural; faz brotar uma floresta e põe de volta o carpete verde nas montanhas. Quando eu era criança viajávamos pra Minas e a lembrança das matas fechadas já nas estradas me é ainda bem nítida: montanhas de couve-flores gigantes. Os postes de transmissão eram seres animados, Megazordes impossíveis de entender.
O mundo é vasto mas cabe no espaço das nossas lembranças - quase tudo a gente reduz à própria experiência. Sebastião-Salgado-pai é como meu pai vai ser no futuro e na velhice. Alguma coisa do sotaque dele me comoveu, ou no jeito de enumerar os passarinhos que viviam ali...não sei. 
A história do homem é uma história das guerras? É Êxodos ou Gênesis? 

domingo, maio 24, 2015

Apontamentos

Apontamentos avulsos e breves só para não perder o pensamento:

1. Uma fala de dez minutos de um professor genial é capaz de fazer mais pela orientação intelectual de uma pessoa que uma vaga formação de anos e anos. Um professor que apresente uma possibilidade de ensino libertária, descentralizada das categorias ocidentais de relações capitalistas entre tempo e trabalho, que respeite a diversidade de culturas e que seja coerente em suas escolhas e em sua vida com sua proposta de aula é um modelo insuperável.

2. Já esqueceram algumas coisas aqui em casa:
um chapéu, um casaco, chaves e óculos embaixo do pacote de salgadinho.
Não sei se foi de propósito, pequenos pretextos para um retorno. Não sei se foram apenas coincidências ou vezes em que as pessoas estiveram tão à vontade que perderam a preocupação com seus pertences. 

3. O delírio da febre e o sono acumulado da semana. 
Expurguei os males no suor, nos calafrios e tremores, lavando-os nos banhos para baixar a febre. É preciso, sim, tempo e ritmo do corpo - do contrário, ele impõe suas necessidades e nos faz parar, nos faz arranjar o tempo para o descanso das piores formas possíveis. E ainda tem o cheiro da doença, o cheiro da febre e dos remédios na pele, no suor e na urina. É preciso lavar tudo - corpo, roupas, toalhas e lençóis - para desintoxicar da doença e desobstruir a cura.

terça-feira, maio 19, 2015

Beleza

Carolina Maria de Jesus "sentia ideias que [...] desconhecia".
Quer coisa mais bonita que isso? O sentimento do saber inerente, que ultrapassa séculos e continentes, que aponta para a sabedoria soterrada nos lixões, favelas, rituais, que resgata e revive nossos ancestrais?

quinta-feira, maio 14, 2015

Sobre "ficar bem", mas não "ficar"

Vamos ficar bem, eu sei, mas algumas coisas não vão ficar. O mais duro, porém, são os entes, os seres que não ficam, não permanecem. Um pedacinho de nós está literalmente morrendo; estamos assistindo perplexos e paralisados sob a ameaça de ter de tomar uma decisão para aliviar o sofrimento - a decisão que julgamos justa a respeito de uma situação sobre a qual não se conhece o outro lado.
Já não sei o que posso falar porque na verdade estou de longe. A lembrança me arrebata volta e meia como aviso de algo que está para acontecer, amargando os dias e os gostos. Deveríamos nos deter na lembrança do percurso, mais que no final, na despedida. Mas como isso é possível? A natureza é cruel em suas resoluções e acho difícil verbalizar enquanto me percebo, há alguns dias, num estado de negação, confiando na imprevisibilidade dos fatos e nas possibilidades menos traumáticas.
O tempo, sempre ele.

segunda-feira, maio 04, 2015

História

May the fourth be with you.

sexta-feira, maio 01, 2015

Aprendendo a esperar o sinal abrir

Ontem eu pensava: eu quero sabedoria pra decidir.
Queria acordar amanhã - na verdade, já hoje - com umas respostas pontuais e um problema específico resolvido. Queria acordar tranquila e passar um dia bom dançandinho Wilco.
Não tive bons resultados, mas bons indícios. Nada se resolveu, mas nem tudo está perdido. O mundo exige de mim uma paciência absurda e me entrega um caminho de sorte, de pessoas dispostas a me ajudar. Sinto muito sono e preocupação, mas volta e meia uma ternura infinita molha os olhos porque nem todo mundo é mau, mesquinho ou me trata com indiferença. E bem sei: preciso ter paciência comigo mesmo até o estado de atenção dessa paixão triste passar. Até lá é caminho. Muito trabalho e formação.