sábado, novembro 08, 2014

Narrativas

De um impulso eu li o Meu pé de laranja lima e terminei o livro aos prantos. Não seria mentira se dissesse que já na página 02 tive a sensação de que seria um livro especial, uma sensação parecida com a que tive ao iniciar o 1933 foi um ano ruim. Os dois romances guardam muitas semelhanças que disparam minha sensibilidade: narrativas de família centradas em um membro do núcleo familiar - os protagonistas Zezé, no romance de José Mauro de Vasconcelos, e Dominic Molise, no de John Fante. Famílias pobres, de cotidiano duro, que também as torna pessoas duras, especialmente a figura do pai, que em ambos os romances representa a autoridade imposta, o ápice do conflito, a violência. Os protagonistas encarnam por vezes o erro, muito embora por dentro sejam pessoas sensíveis demais, precoces demais, mas não se furtam a tentar resolver os problemas sempre da pior maneira possível, como é comum às pessoas normais
Dominic tem n'O Braço a proteção e a projeção de um sonho que não é só um sonho individual, mas que poderia tirar a família da pobreza. Zezé, como criança, tem o refúgio na dimensão da fantasia, no seu Minguinho, Xuxuruca, o pé de laranja lima que é o melhor amigo. Por outro lado, o Portuga é o maior amigo, a figura paterna carinhosa, compreensiva mas que sabe repreender, e que abomina ao mesmo tempo os palavrões pelos quais Zezé expressa sua revolta e raiva e a violência crônica com a qual Zezé é tratado em casa, além da violência psicológica, ao ser levado a crer que não é uma boa criança e que tem o diabo como padrinho. 

Zezé conhece cedo a dor e a descreve com a simplicidade de quem vê as coisas pela primeira vez. Dominic é levado a compreender que o orgulho de ser o que se é ultrapassa mesmo os maiores sonho.