terça-feira, junho 30, 2015

Sobre fascínios

Você, eu e muitos outros queremos algo que fascine, descobrir uma motivação pra vida, um sentido pros dias, que cause arrepios e deixe os cabelos em pé.
Eu me pergunto em que medida isto não é um instrumento de controle, um norte para não termos de lidar com o desconhecido de cada dia, com o fato de que nossa existência não necessariamente possui - ou precisa ter - finalidade. A ideologia do trabalho e do amor, do faça o que ama gera tanto os workaholic quanto os meritocratas que aguardam ansiosamente a recompensa por empregar seu tempo em algo que gostam. Sem contar o inexorável sentimento de superioridade por se dedicar a algo que pretensamente seria mais profundo e verdadeiro que meros trabalhos e ocupações. 
Qual a urgência em definir o mote de sua vida? Para não ter de se questionar mais sobre as escolhas, sobre os rumos, sobre o que gosta, o que dá prazer? Não é possível que várias coisas deem prazer, em vários momentos da vida?
Filosofia é minha praia. Até bem pouco tempo eu sequer conhecia praia, hoje gosto, me dá prazer o sol, o mar, ainda que sem saber nadar. E por muito tempo da minha vida não conhecia filosofia, e era feliz assim também. Arte é um meio termo, ainda não resolvi muito bem comigo mesmo o fato de me soar tão elitista o trabalho considerado "artístico" - mas música, cinema, literatura e as teorias, crítica e história destas me dão prazer. Ensinar prende minha atenção; descobrir o funcionamento da língua e levar outros a pensar sobre isso me arranca sorrisos satisfeitos. O pensamento sobre gênero e sobre direitos humanos foi e é fundamental na minha formação humana. 
Mas e todo este mundo ainda por conhecer? Não corro o risco de me cegar ao definir sem volta os limites de minha vida aos 25 anos - ou aos 50, mesmo aos 70?
Não vamos nos angustiar - interesses fazem bem à mente, descobrir algo que gosta dá prazer, mas a fixação estagnada tem um potencial destruidor de nossa criatividade e ânimo. Tenhamos cuidado com essa imagem, essa coisa shiny-happy-people largando tudo - especialmente quando continuam a ter tudo mesmo "largando-tudo" - para fazer o que amam.